Por: Gisele Rose
21/02/2024 | 13:07
A intelectual negra Azoilda Loretto da Trindade (1957-2015), afirmava que possuímos valores marcados por uma diversidade, somos descendentes de organizações humanas em processo constante de civilização – digo processo, e não evolução. Como afro-brasileiras e afro-brasileiros, ciosas/os e orgulhosas/os desta condição, em diálogo com valores humanos de várias etnias e grupos sociais, imprimimos valores civilizatórios de matriz africana à nossa brasilidade que é plural (TRINDADE, 2015).
Ao pensarmos sobre os valores civilizatórios afro-brasileiros, criamos possibilidades de contar novas histórias, inserir sujeitos e subjetividades, dentro deste ambiente escolar que pode e deve ser acolhedor e respeitoso com todas e todos, forjando uma pedagogia antirracista. São, ainda hoje, fundamentais para o ambiente escolar, mas também para outros espaços, pois Azoilda nos mostra que esses valores podem ser pensados e aplicados dentro e fora do cotidiano da escola, agindo como estratégia de múltiplas atuações, pois:
Ao destacarmos a expressão “valores civilizatórios afro-brasileiros”, temos a intenção de destacar a África, na sua diversidade, e que os africanos e africanas trazidos ou vindos para o Brasil e seus e suas descendentes brasileiras implantaram, marcaram, instituíram valores civilizatórios neste país de dimensões continentais, que é o Brasil. Valores inscritos na nossa memória, no nosso modo de ser, na nossa música, na nossa literatura, na nossa ciência, arquitetura, gastronomia, religião, na nossa pele, no nosso coração. Queremos destacar que, na perspectiva civilizatória, somos, de certa forma ou de certas formas, afrodescendentes. E, em especial, somos o segundo país do mundo em população negra (TRINDADE, 2005, p. 30).
Os valores civilizatórios afro-brasileiros são princípios e normas que constituem nossa existência no âmbito de nossas subjetividades e coletividades que forjam estratégias para nossas ações e posicionamentos nas várias esferas cotidianas.
Dito isto, para percorrermos esses valores civilizatórios afro-brasileiros começaremos com o princípio do AXÉ/ENERGIA VITAL, que está presente em tudo que é vivo, pois tudo o que existe tem axé. Tem energia vital nas plantas, água, pedras, animais, ar, tempo, ou seja, tudo é sagrado e está em interação (TRINDADE, 2005).
Se entendemos que tudo que está neste plano terreno é sagrado, nada mais justo que tenhamos olhares e ações diferenciadas com todos os seres que vivem ao nosso redor. Essa atitude nos fará perceber como é importante nossas ações e falas para com o outro.
Em nossa sociedade o sujeito negro evidencia silenciamentos opressores e constantes, por isso pensar sobre oralidade é tão importante, pois um dos fatores que torna nossas existências visíveis e livres é o ato de falar. A ORALIDADE, nossa expressão oral é carregada de sentido, de marcas de nossa existência (TRINDADE, 2005), pois nossa fala evidencia o nosso estar no mundo, a capacidade de se comunicar e aprender com o outro.
Neste resumo são abordados os valores civilizatórios afro-brasileiros, valores estes que ressaltam como afro-brasileiras e afro-brasileiros ciosas/ os e orgulhosas/os desta condição, em diálogo com valores humanos de várias etnias e grupos sociais, imprimimos valores civilizatórios de matriz africana à nossa brasilidade que é plural como fundamentação possível de propor um giro epistêmico na promoção de uma pedagogia que seja efetivamente antirracista.
Os valores civilizatórios afro-brasileiros forjam propostas para se pensar uma ação antirracista, mas principalmente para uma educação libertadora. A partir da construção de afetos no cotidiano escolar, que podem pensados de forma conjunta nas instituições de ensino, fomentando debates, diálogos e trocas de saberes gerando e proporcionando uma nova perspectiva de ensino.
Os valores civilizatórios afro-brasileiros compilados pela intelectual negra Azoilda Loretto da Trindade nos permitem pensar sobre uma ação antirracista que compreende cada sujeito inserido em cotidianos escolares como único e diverso, valores que perpassam histórias e memórias. Mas, que principalmente nos permite dialogar, perceber e ser percebido pelo outro de forma plena.
Referência
TRINDADE, Azoilda Loretto da. Valores civilizatórios afro-brasileiros na educação infantil. In: Valores afro-brasileiros na educação. Boletim 22, páginas 30 a 36, 2005. Disponível em: <http://teiaufmg.com.br/uab/conteudo/modulo03/anexos/valoresafrobrasileiros.pdf.>.
Gisele Rose
Filósofa e escritora. Professora da Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC-RJ). Mestra em Relações étnico raciais pelo Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET-RJ), Especialista em Energia e Sociedade no Capitalismo Contemporâneo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Graduada em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)... [+ informações de Gisele Rose]
Rede Social de Gisele Rose:
Comments